01. Comprar na planta pode ser uma boa estratégia, mas é um contrato de longa duração, baseado em promessa de entrega futura e sujeito a riscos jurídicos e financeiros. Antes de assinar, o primeiro passo é investigar quem está por trás do empreendimento. Verifique a incorporadora e a construtora, o histórico de obras entregues, a pontualidade, a qualidade do acabamento e a saúde financeira. Visitar empreendimentos já concluídos pela mesma empresa, conversar com moradores e pesquisar reclamações públicas ajuda a medir o risco real do negócio.
02. Segundo ponto, analisar minuciosamente o registro do empreendimento no cartório e as informações sobre isso no contrato. Todo empreendimento deve ter registro de incorporação na matrícula do terreno e alvará de construção válido. Esses dados precisam aparecer de forma clara no contrato, em especial no quadro-resumo. Também é essencial conferir a existência de patrimônio de afetação, regime que separa os recursos da obra do restante do patrimônio da empresa e reduz o risco de paralisação por problemas alheios ao empreendimento.
03. O contrato deve ser lido integralmente e comparado ao memorial descritivo e às peças de venda. O memorial descreve padrões de acabamento, materiais, metragens e áreas comuns; é ele que amarra a promessa comercial ao que efetivamente será entregue. Divergências entre folhetos, decorado e memorial devem ser sanadas antes da assinatura. No contrato, observe prazo de entrega, período de tolerância, critérios de correção monetária, multas por atraso de cada parte, regras de distrato, retenções e prazos de devolução. A tolerância costuma ser prevista até cento e oitenta dias, mas precisa estar clara e sem brechas que convertam tolerância em prorrogação indefinida. Cláusulas assimétricas, que punem pesadamente o comprador e aliviam a construtora, tendem a ser questionáveis.
04. O valor anunciado raramente é o valor final do desembolso. É indispensável montar o fluxo financeiro completo. Compreenda entrada, parcelas durante a obra, correção monetária pelo índice aplicável e saldo a ser quitado por financiamento ou repasse ao banco na entrega das chaves. Verifique a existência de cobranças adicionais como corretagem e taxas de assessoria e se essas quantias estão destacadas e previamente informadas. Avalie ainda os chamados juros de evolução de obra, para entender quando incidem e em que hipóteses deixam de ser repassados ao comprador, sobretudo se houver atraso imputável à construtora. Essa análise evita surpresas no orçamento e reduz a chance de inadimplência futura.
05. A avaliação técnica do projeto também importa. Localização, acesso, vizinhança, incidência solar, ventilação, vagas, dimensionamento de cômodos e compatibilidade entre a planta anunciada e a planta registrada têm impacto direto no uso e na valorização. Alterações de projeto precisam de transparência e concordância informada do comprador, sob pena de discussão futura. Em empreendimentos com personalização, confirme prazos, custos e responsabilidade por eventuais incompatibilidades técnicas.
06. O risco mais frequente é o atraso. Por isso, além de checar a data contratual e a tolerância, vale entender quais são as consequências jurídicas se a entrega não ocorrer no tempo devido. O comprador pode discutir a suspensão de encargos ligados à obra, exigir indenização pelo período de atraso quando opta por manter o contrato ou avaliar a rescisão com devolução das parcelas conforme as regras aplicáveis. Tudo isso deve estar mapeado desde o início, com documentos e comunicações guardados de forma organizada.
07. Próximo da entrega, a atenção se volta à vistoria e às garantias. O imóvel deve ser conferido à luz do memorial descritivo, com registro fotográfico de vícios aparentes e apontamento formal para correção. Vícios de construção que afetem solidez e segurança possuem prazo de garantia mais amplo, enquanto defeitos de uso e acabamento seguem prazos próprios de reclamação. É importante também definir quando nascem as obrigações de condomínio e de tributos, distinguindo a emissão do habite-se do efetivo recebimento das chaves e da posse.
08. Por fim, guarde todos os documentos da negociação: propostas, e-mails, mensagens, folder do decorado, plantas, planilhas, comprovantes de pagamento e eventuais aditivos. Esse conjunto forma a prova do que foi prometido e do que foi cumprido, facilitando a prevenção de conflitos e a adoção de medidas administrativas ou judiciais, se necessário.
A recomendação prática é simples: não assine nada sem analisar a documentação do empreendimento e o contrato com um advogado especializado em direito imobiliário. A leitura técnica antecipa riscos, ajusta cláusulas desequilibradas, dimensiona corretamente o custo total e indica a melhor estratégia para o seu caso. Informação e assessoramento jurídico no início costumam custar muito menos do que remediar um problema quando ele já se tornou um litígio.