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Entenda a Multipropriedade: Como Funciona, Quais os Riscos e Como Cancelar.

1. O que é multipropriedade?

A multipropriedade imobiliária — também conhecida como cota de multipropriedade ou fração imobiliária — é um regime jurídico em que um mesmo imóvel é compartilhado por diversos proprietários, cada um com direito de uso exclusivo por um período determinado no ano. Cada comprador adquire uma fração do imóvel e tem direito ao uso por dias ou semanas específicos, conforme contrato.

2. Como funciona na prática?

Na teoria, a multipropriedade permite ao comprador:

  • Usar o imóvel em um período definido anualmente;
  • Dividir os custos de manutenção com outros proprietários;
  • Acessar estruturas de lazer em locais turísticos de alto padrão;
  • Participar de sistemas de intercâmbio, em que poderia trocar seu período com cotas em outros empreendimentos no Brasil ou no exterior.

O contrato estabelece se o período de uso será fixo (mesmo período todo ano), flutuante (sorteio ou agendamento) ou misto.


3. Como acontecem as apresentações de venda?

A maioria das vendas de multipropriedade não ocorre em escritórios ou plantões tradicionais. O consumidor é convidado para:

  • Eventos em hotéis ou resorts;
  • Apresentações com brindes, café da manhã e “ofertas imperdíveis”;
  • Conversas com vendedores treinados em persuasão emocional.

Em muitos casos, a proposta é apresentada como um “investimento em férias” ou “forma de lucrar alugando a cota”. Os vendedores usam gatilhos como escassez (“últimas unidades”), recompensa (“ganhe uma diária grátis”) e pressão (“tem que decidir hoje”).


4. Quais são as principais incorporadoras que atuam com multipropriedade no Brasil?

Algumas das mais conhecidas são:

  • WAM Brasil (resorts em Caldas Novas, Olímpia, Gramado e outros)
  • GAV Resorts
  • Hot Beach Suites Olímpia
  • Laghetto Hotéis e Resorts
  • Enjoy (antiga GJP)
  • Grupo Pratagy
  • Hard Rock Hotel (empreendimentos via VCI S.A.)

Essas empresas atuam em cidades turísticas como Caldas Novas/GO, Olímpia/SP, Gramado/RS, Porto Seguro/BA, Natal/RN, entre outras.


5. Qual é a legislação que regula a multipropriedade?

As principais normas são:

  • Lei nº 4.591/1964 — Lei das Incorporações Imobiliárias.
    Lei nº 13.777/2018 – Regula a multipropriedade imobiliária, define o regime jurídico, registro e administração.
  • Código Civil – Artigos 1.358-C a 1.358-F.
  • Código de Defesa do Consumidor (CDC) – Aplicável aos contratos de multipropriedade, sobretudo no que se refere à propaganda enganosa, direito de arrependimento, cláusulas abusivas e dever de informação.
  • Lei nº 13.786/2018 (Lei do Distrato) – Ainda que o art. 67-A §12 afirme que multipropriedade tem legislação própria, seus princípios e entendimentos são aplicados por analogia nos tribunais.
  • Súmula 543 do STJ – Garante devolução integral dos valores pagos em caso de culpa exclusiva do fornecedor.

6. Quais os riscos mais comuns para o consumidor?

  • Promessas não cumpridas (como aluguel garantido, rentabilidade, ou uso facilitado).
  • Período de uso restrito, difícil de agendar ou em baixa temporada.
  • Cobrança de taxas inesperadas: taxa de fruição, taxa administrativa, IPTU, condomínio, etc.
  • Obra atrasada ou sequer iniciada.
  • Cláusulas abusivas no contrato, que dificultam o cancelamento.
  • Dificuldade de revenda da cota ou revenda com desvalorização extrema.
  • Ausência de entrega de documentação.

7. Quais são os problemas mais relatados por consumidores?

As reclamações mais frequentes no Reclame Aqui e ações judiciais envolvem:

  • Venda sob pressão emocional e sem tempo de reflexão.
  • Impossibilidade de cancelar o contrato, mesmo dentro do prazo legal.
  • Retenção de valores abusiva (acima de 25%).
  • Negativação do nome mesmo após solicitação de cancelamento.
  • Promessas de investimento e lucro que não se concretizam.
  • Uso de cláusulas como “irrevogabilidade” para desestimular o distrato.

8. É possível cancelar o contrato de multipropriedade?

Sim, é possível cancelar. Existem dois caminhos:

Cancelamento extrajudicial:

  • O consumidor pode solicitar o distrato por e-mail, carta registrada ou notificação extrajudicial.
  • A empresa pode aceitar o pedido e fazer a devolução dos valores pagos, com ou sem retenção (dentro do limite legal).

Cancelamento judicial:

  • Se houver recusa, cobrança indevida ou retenção abusiva, o consumidor pode entrar com ação pedindo:
    • Rescisão contratual.
    • Devolução de valores pagos (com base no CDC e jurisprudência).
    • Suspensão imediata das cobranças (via liminar).
    • Indenização por danos morais e materiais.

9. Quais são os direitos do consumidor nesses casos?

  • Direito de arrependimento (art. 49 do CDC): em até 7 dias da assinatura, se o contrato foi feito fora do estabelecimento.
  • Direito à informação clara e adequada.
  • Direito de cancelar contratos com base em vício de consentimento, propaganda enganosa ou cláusulas abusivas.
  • Direito à devolução de valores pagos, com limite de retenção de até 25% (e só em casos específicos até 50%).
  • Direito de suspender cobranças enquanto o distrato é discutido judicialmente.
  • Direito à indenização em caso de negativação indevida, pressão abusiva ou prejuízos financeiros.

Conclusão

A multipropriedade é apresentada como uma oportunidade de lazer com economia. Mas, na prática, muitas vezes se revela um contrato cheio de restrições, taxas ocultas, promessas não cumpridas e enorme dificuldade de cancelamento.

Por isso, é essencial que o consumidor:

  • Leia o contrato com atenção.
  • Documente todas as promessas feitas na venda.
  • Conheça seus direitos.
  • E, se necessário, busque orientação jurídica especializada para cancelar o contrato e reaver o que pagou.

Você tem direitos. Não precisa carregar sozinho um contrato injusto.


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